Renata Moura - Editora interina de economia
O superintendente da Caixa Econômica Federal no Rio Grande do Norte, Roberto Sérgio Linhares, criticou ontem a exclusividade praticamente mantida pelo Banco do Brasil na concessão de empréstimos consignados a servidores estaduais e afirmou que, sem poder abocanhar uma parcela desse mercado – que representa, segundo ele, 70% do crédito à pessoa física no Estado - a Caixa está buscando caminhos alternativos para robustecer suas metas. E a disputa pelos negócios do governo, o que inclui a folha de pagamento dos servidores, é o principal alvo dentro dessa investida. “Se o crédito de consignáveis é reduzido, eu tenho que buscar alternativas”, disse, à TRIBUNA DO NORTE. Eis os principais trechos da entrevista:
Quanto o crédito consignado representa no RN?
Com certeza mais de 70% do crédito à pessoa física no estado. Então é algo monstruoso. Por isso que todo banco se interessa, principalmente os bancos que querem ganhar dinheiro fácil em cima do servidor.
Por que dinheiro fácil?
Ganhar dinheiro fácil porque em qualquer empréstimo ou negócio que um banco faz há três componentes fundamentais, que são risco, retorno e liquidez. A liquidez é quanto mais tempo você passar com o seu dinheiro parado o banco vai lhe dar uma rentabilidade um pouco maior, porque ele pode usar esse dinheiro de forma mais tranquila, não tendo que lhe devolver rapidamente. A questão do risco e retorno tem uma relação direta. O cheque especial, por exemplo, cobra uma taxa de 7%, 7,5% ao mês, porque não tem segurança nenhuma para o banco. O retorno é muito alto para ele, para compensar essa possibilidade de perda que é grande. Na consignável isso não acontece. No empréstimo consignado o retorno é praticamente garantido. Então é um empréstimo que o banco coloca sem praticamente nenhum risco de retorno. É por isso que todo mundo quer entrar.
Esse “ganhar dinheiro fácil” é uma crítica ao Banco do Brasil?
É mais uma crítica aos pastinhas, ás financeiras, do que mesmo ao Banco do Brasil. No caso de algumas exclusividades que se discute aí sim é que vai a crítica não ao Banco do Brasil, mas à exclusividade do consignável em si. Porque imagine só, se o órgão público legalmente instituído visa o bem da comunidade, o bem do servidor público, por que amarrar o servidor público trazendo prejuízos para ele? Se for para amarrar trazendo benefício é o papel. Agora, amarrar trazendo prejuízo é o que não se permite.
Por que trazendo prejuízo?
No estado, havia um decreto que permitia uma taxa de juros mensal para os servidores de 1,84% ao mês.
Para o banco que detém exclusividade nos consignados?
Para todos os bancos. Todos os bancos participavam disso. Quem quisesse se habilitava e fazia consignável para o servidor. O empréstimo em consignação é o empréstimo do servidor com o banco. O ente público somente averba em folha e repassa para o banco aquele valor. Então qualquer um fazia à taxa de 1,84%. Com a exclusividade, a taxa aumentou para 2,34%, a mínima. O que ocorre é que normalmente o ente patronal recebe um valor por essa negociação. E quanto mais o banco consegue puxar na taxa de juros para cima ou em tarifas negociadas maior o valor que ele recebe. Então na verdade muitas vezes essas instituições se preocupam mais em quanto vão receber e não como vai ser o empréstimo concedido depois. E nem com a questão legal. Porque do ponto de vista administrativo, legal, financeiro e econômico não se justifica a exclusividade. No administrativo, a folha de pagamento deve ser centralizada, para o bem da administração, para evitar que vá crédito de salário para todos os bancos e fique difícil a questão da administração. Já a consignável não. A consignável é uma troca de arquivos que é feita com a instituição contratada pelo ente patronal onde é tudo via online. Debita-se de fulano e envia-se isso virtualmente. É algo que não prejudica a administração. Do ponto de vista financeiro também não se justifica. Porque, imagina, o servidor que era para ser o maior beneficiado é prejudicado. Há um aumento da taxa de juros, quando era para haver uma redução para facilitar o acesso aos consignáveis. Do ponto de vista legal é uma afronta ao direito constitucional. A exclusividade tolhe o direito do trabalhador de contratar diretamente com quem ele quer. Essa livre escolha de contrato de empréstimo é garantida constitucionalmente. Pode até se vender todos os negócios da instituição, como a folha de pagamento, as contas, as aplicações financeiras. Pode-se vender tudo isso, menos o direito do trabalhador contratar com qualquer instituição que ele queira. Acho que a população tem que se mobilizar para acabar com isso, como aconteceu em Minas Gerais. Em Minas Gerais o Ministério Público exigiu um termo de ajustamento de conduta e as instituições acabaram com a exclusividade de consignações. Tem nove, de 63 que existiam, que estão aderindo aos poucos para acabar com a exclusividade. Isso levou até o Banco Central a lançar a circular Bacen 3522, dizendo: “bancos é proibida a exclusividade de consignados. Porque isso afronta a livre atuação das instituições financeiras e dos clientes escolherem a melhor opção para eles.
No ano passado um decreto do governo acabou com a exclusividade. Este ano, o TJRN decidiu pelo fim da exclusividade, mas em cima de um decreto já extinto. O Banco do Brasil é ou não a única instituição que pode conceder?
Hoje, por incrível que pareça não. Apesar do Banco do Brasil defender isso. Por exemplo, o BMG empresta dinheiro no governo do estado. O decreto, mais atual do governo diz que para fornecer consignáveis, a instituição tem que centralizara folha de pagamento do ente. O Banco do Brasil tem a maior parte e a caixa tem uma pequena parte. Só os dois atendem esse requisito. E que além disso deve ter unidades bancárias da instituição em todos os municípios. Quem é que conhece uma unidade do BMG no Rio Grande do Norte? A Caixa Econômica tem um estabelecimento ou da Caixa ou de representante legal da Caixa em todos os municípios do Brasil. O BB com certeza deve ter também. Então seria para estar caixa e BB concedendo. Mas quem está concedendo crédito consignado no estado é BB e BMG. BMG porque tem uma liminar que não conseguiram derrubar ainda, questionando a exclusividade. E não sei porque motivo se enquadra nessa de ter agencia em todas a cidades do RN. A exclusividade é uma excrescência legal e que deve que ser abolida para o benefício de todos que estão sendo prejudicados por ela. Eu estou tentando realizar consignáveis desde o final do governo passado, mas não consigo. A Caixa Econômica Federal atende os critérios, mas não consegue fazer.
Qual é o empecilho?
Dizem que ou a procuradoria do estado, ou a secretaria de administração, que eu não sei se é o caso agora, mas alguém justifica que não se atende os requisitos, quando se atende os requisitos.
Na visão da Caixa tem ou não tem exclusividade?
Tem exclusividade. O BMG só opera no governo do estado por causa de liminar. Há na prática exclusividade sim. No caso da Caixa, em nenhum contrato que a firmado no estado se prega a exclusividade de consignados.
Para derrubar essa exclusividade só com uma nova ação na justiça..
Sim. Pelo que se diz, o decreto que foi revogado é um anterior. Aí teria que ter uma nova ação para o decreto que está vigendo normalmente, mesmo com a anulação que foi feita pela justiça do decreto anterior.
A Caixa pensa em se movimentar em relação a isso?
Não. Acho que não é um papel da caixa fazer isso.
Mas por que a Caixa vem falar sobre isso?
Por que a gente entende como sendo algo que impede a livre a concorrência. Algo que de certa forma prejudica daqui a pouco o andamento das próprias instituições. O cidadão, Roberto Sérgio, não se sentiria bem se vendo obrigado a contratar com uma só instituição.
Quais foram os efeitos da decisão recente da justiça na Caixa? Os servidores estaduais têm procurado o banco?
Eles nos procuram bastante, diariamente. Inclusive os que tem conta conosco buscam liminar na justiça para fazer o empréstimo. Inclusive aumenta agora a pressão. Perguntam por que que a Caixa não compra os negócios do governo do estado. E é algo que eu não posso dizer que sim nem que não. Mas que a gente tem interesse. Agora eu garanto uma coisa, se a gente fizer a compra dos negócios do governo ou de qualquer ente isso vai ser feito sem colocar a cláusula de exclusividade dos consignados. E aí o que vai dizer quem vai ganhar ou não o servidor é a taxa praticada.
“Estamos entrando forte nas folhas”
A Caixa pretende disputar com o BB os negócios do governo do Estado?
Na verdade o mercado está aí. A gente concorre normalmente o tempo todo. A gente está no mercado e está buscando vários negócios.
A Caixa já deteve os negócios do governo aqui no Estado?
Já. Não com exclusividade, mas uma grande parte juntamente com o Banco do brasil. Até haver a centralização da conta única e dos negócios do servidores do governo no banco do brasil. Se eu dissesse que a gente não tem interesse eu estaria mentindo. Mas só o avançar das negociações vai dizer quem fica com o que ou não.
Isso está sendo negociado neste momento?
Está.
E quando deve haver uma definição em relação a isso?
Não tem prazo porque depende muito das partes. Eu não sei como vai ser o avançar dessa negociação, primeiro com o parceiro governo do estado e depois com o parceiro Banco do Brasil. Eu não considero o Banco do Brasil como concorrente. O BB é um parceiro da Caixa, assim como é o banco do Nordeste. Por ser uma instituição pública. Apesar de a gente viver numa livre concorrência e estar o tempo todo buscando o cumprimento dos objetivos de cada uma das instituições.
Como funciona a compra dos negócios do governo?
Se faz um levantamento de quanto é possível pagar em termos de receitas, em movimentação de contas, de tarifas que vem em função da incorporação da conta ou dos negócios daquela entidade, da folha de pagamento, dos negócios com os próprios servidores e aí se chega à conclusão que é um determinado valor que tem que ser pago. E aí começa-se a negociação e se paga esse valor para a instituição. Isso é algo totalmente aceito, permitido e acobertado pela legislação. É uma prática de mercado. Qualquer instituição pode comprar, dependendo dos requisitos que o órgão exija. A folha do governo está no banco do brasil há mais de seis anos. A Caixa tinha os consignáveis normalmente. E as folhas de quem queria ter conosco a gente podia ter. Só de 2006 pra cá é que houve um rigor maior nesse contrato e a exclusividade de consignado [conseguida pelo BB] é recente. Do segundo semestre do ano passado pra cá. Então a agente trabalhava normalmente com os servidores, agora que veio complicar mais um pouco em função dessa trava. Mas você sabe que toda ação tem uma reação. E a nossa reação vai ser – já que é exclusividade – a gente vai buscar comprar.
O troco da Caixa é comprar os negócios do governo do Estado?
É comprar os negócios do governo do estado e os outros todos. A gente está entrando fortemente nesse mercado. Já compramos vários e vamos comprar vários outros. Esperamos definir isso [a compra dos negócios do governo] ainda este ano. Nós temos plenas condições de no negócio que a gente considere como sendo viável buscar trazer esse negócio pra gente. E eu considero, como gestor da instituição, que é um negócio viável, que é algo favorável à instituição e que pode trazer benefícios pra ela e inclusive para os clientes. Se eu dependo do crédito de consignáveis e o crédito de consignáveis é reduzido, eu tenho que buscar alternativas. Então uma alternativa é buscar a compra de folhas. Que é o que a gente está fazendo. Compramos recentemente em Mossoró. Compramos folhas três na grande natal. Estamos finalizando no vale do Assu. Na região do Seridó. Estamos entrando com, gosto de gás nesse negócio.
Mas o olho maior é no governo?
Sim. É como se fosse o diamante maior. Vai ser a nossa maior vitória, se a gente conseguir,.
E quanto a Caixa está disposta a pagar por isso?
Está andando a negociação. A gente ainda não pode falar sobre isso. No que depender de mim o valor que for necessário, agora vai depender também dos limites da instituição. Mas se depender do gestor Roberto Sérgio, o valor que for necessário.
O apetite da Caixa pelos negócios do governo cresceu depois da repercussão dos consignados?
Cresceu pela própria necessidade que a gente tem de crédito. Mas isso não é pelos negócios do governo. É pelos negócios de qualquer instituição que detenha uma folha e que seja considerável o número de empregados dessa folha.
sábado, 12 de fevereiro de 2011
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