domingo, 23 de janeiro de 2011

Moradores de casas ficam "ilhados" entre prédios

Habitantes de moradias cercadas por edifícios de todos os lados resistem a se desfazer de seus imóveis
Erta Souza // ertasouza.rn@dabr.com.br



"Natal é uma cidade sempre nova, sem casario triste e sujo, sem os sobradões lúgubres que ainda o Recife é obrigado a manter". Publicado na edição do Diário de Natal do dia 10 de junho de 1949, o texto "Natal, cidade sempre nova" do folclorista Câmara Cascudo parece mais atual do que nunca e reflete o que vem ocorrendo em diversos bairros da capital potiguar: o desaparecimento das antigas e tradicionais residências em detrimento de um avassalador desenvolvimento urbano.


Casa construída em 1954 na Rua Maxaranguape, no Tirol, ficou solitária num cenário cada vez mais vertizalizado Foto: oana Lima/Esp/DN/D.A Press
O ato dos moradores que ainda resistem a esse processo e às tentações de vender seu bem mais precioso está sendo considerado pelos estudiosos da área de arquitetura e desenvolvimento urbano como uma atitude de resistência, também bastante motivada pelo amor ao imóvel e pela tradição familiar.

Apesar das inúmeras tentativas de empresas proprietárias de empreendimentos imobiliários ou comerciais tentarem comprar seus imóveis, a professora universitária Edja Trigueiro, 57 anos, e o recepcionista Max BrenoAlves da Silva, 34 anos, resistem em vender os imóveis.

Alguns desses imóveis tão cobiçados pelos proprietários de empreendimentos imobiliários e comerciais ficam em bairros tradicionais da capital potiguar. Esse é o caso da residência da professora Edja. Construída em 1954 por um mestre de obras que estava prestes a se aposentar, a casa chama a atenção de quem passa pela Rua Maxaranguape, em Tirol, devido ao estilo arcaizante com traços fortes dos anos 40. Literalmente "ilhada" entre empreedimentos imobiliários e comerciais, a professora conta que conviveu durante muitos anos com quatro vizinhos, porém há três meses o último cedeu às ofertas tentadoras e vendeu a casa.

Com a saída dos antigos moradores, a professora e os familiares ainda estão se acostumando com a solitária rotina. "Um senhor que morava aqui na rua tinha um terreno com muitas árvores frutíferas que era um verdadeiro presente para as crianças que viviam brincando lá. As árvores foram ao chão quando o espaço foi vendido para se transformar em estacionamento", lembra. Sem vizinhos há três meses, a professora e seus familiares ainda estão se acostumando com a nova rotina da rua.

De acordo com o professor do Departamento de Arquitetura da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, George Ferreira Dantas, com a modificação na vida social desses locais, as relações sociais dos antigos moradores mudam significativamente. "Essas pessoas normalmente têm uma relação afetiva com o imóvel construída ao longo de muitos anos. Além do mais, com esse tipo de mudança social, a população daquele local passa a usar medidas de segurança como muros altos e cerca elétrica. Sem falar na perda das relações sociais que existiam com os vizinhos", comenta o professor.

Mesmo ainda resistindo às fortes investidas das empresas para comprar sua casa, o recepcionista Max Breno revelou que já pensou em vender o imóvel que recebeu de herança do avô. No entanto, sua tia, que apesar de não morar no imóvel, divide a herança com ele o fez pensar melhor. "Ela tem um carinho muito grande pela casa e além do mais achamos que podíamos vender por um preço melhor. Então resolvemos continuar por aqui", afirmou.

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