sábado, 2 de abril de 2011

“RN precisa investir em pesquisa”

Embora o assunto Ciência e Tecnologia venha sendo cada vez mais discutido na sociedade, a participação dos setores produtivos na produção científica ainda é incipiente. Para o empresário e presidente da Federação das Indústrias do Estado do Rio Grande do Norte (Fiern), Flávio Azevedo, o empresariado precisa conhecer e investir mais em inovação – de produtos e de processos. E para isso a parceria com as universidades e pesquisadores é fundamental. Esse será um dos assuntos discutidos na próxima edição do projeto Motores do Desenvolvimento do Rio Grande do Norte – uma realização da TRIBUNA DO NORTE, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Fiern, Fecomércio/RN, RG Salamanca Capital e Governo do Estado, com patrocínio da Petrobras, Assembleia Legislativa e Cosern. O evento está em seu quarto ano de realização e para esta 9ª edição o tema escolhido foi Inovação e Tecnologia. O seminário será realizado no próximo dia 11 de abril, no auditório da reitoria da UFRN, a partir das 8h. As inscrições podem ser feitas gratuitamente pelos telefones 4006.6120 e 4006.6121 – as vagas são limitadas.

alex régisHoje, pela primeira vez, encontramos um respaldo para que o empresário possa pesquisar. Esse espaço não existia há alguns anos. E não me refiro só às oportunidades, mas também às linhas de crédito criadas.Hoje, pela primeira vez, encontramos um respaldo para que o empresário possa pesquisar. Esse espaço não existia há alguns anos. E não me refiro só às oportunidades, mas também às linhas de crédito criadas.
Como é a relação entre a indústria no Rio Grande do Norte hoje com a inovação?


Muito tem-se falado em inovação, mas é preciso conceituar. Você pode inovar um produto ou pode inovar um processo. Como se inova um produto? Você pode inovar de forma muito simples – através de um novo design, ou inovar transformando o produto em um objeto de desejo com uma campanha publicitária, por exemplo. Então, nesse caso, o produto se moderniza. Eu não considero adequado falar em inovação de um produto, mas em modernização. A inovação precisa estar focada no processo. Para se fazer um produto mais barato, mais eficiente, e sobretudo, mais competitivo. E para ele ser mais competitivo ele também precisa ser mais eficiente e mais barato. Então, inovação tecnológica é fator de competitividade. E só se gera competitividade no processo, que por sua vez resulta no produto. Então a maior importância da inovação tecnológica é na competitividade da empresa. Ela é fator de competitividade e eu entendo que em breve será fator de sobrevivência. 

Por que fator de sobrevivência?

É aquela história da aldeia global. O mundo cada dia fica menor, a cada dia os processos de logística se simplificam e se barateiam. Mas o grande problema é mostrar ao empresário brasileiro e nordestino que a inovação pode significar um fator de competitividade. É uma questão cultural. Conseguir convencer o empresário de que o conceito de que “time que está ganhando não se mexe” é um conceito ultrapassado é muito difícil. Há um choque cultural aí. E esse choque não se limita ao dono da empresa, mas da empresa inteira. E aí, quando se ultrapassa a decisão gerencial e se chega dentro da empresa, também temos que enfrentar a resistência do funcionário. Aqui no Nordeste temos uma dificuldade grande na área de educação. E para se trabalhar com competitividade precisamos começar na área da educação. Então na maioria das vezes temos funcionários mal treinados, mal formados – pela própria deficiência não da classe empresarial mas sobretudo por falta de estrutura da educação pública. Aí o empregado passa a encarar a inovação como um adversário. Aí temos uma imensa dicotomia – ou eu ou a inovação tecnológica. “Será que vou perder meu emprego”, ele se pergunta. Aí o empresário tem uma dificuldade imensa de conseguir contornar isso. Por isso, o trabalho da imprensa e a divulgação do conceito saudável de inovação tecnológica é fundamental. Precisamos dar foco a esses  processos de inovação tecnológica para disseminar na sociedade essa cultura. Não é só possível, mas é necessário. Tudo isso faz parte de um processo que começa no chão de fábrica e vai até a pesquisa científica.

Como o senhor avalia o posicionamento do país nesse contexto?

Esse é o grande problema dos países emergentes. Por um milagre o Brasil conseguiu chegar a essa lista, sem investir em pesquisas científicas. A Índia faz pesquisa, a China faz pesquisa, a Rússia faz pesquisa. Dos quatro componentes do BRIC, o único país onde a pesquisa é incipiente, quase inexistente, dentro da área empresarial é o Brasil. Quem faz pesquisa aqui são as universidade e é o Estado que banca esses estudos. Empresa privada não faz pesquisa. Não existe a cultura da pesquisa no empresariado, o que é um equívoco. Porque é a pesquisa que gera a inovação. E esses países já chegaram a um nível tal de excelência que as inovações tecnológicas surgem de processos inesperados. E é importante citar que essas pesquisas já se tornaram rentáveis. Então quando a TRIBUNA DO NORTE coloca a inovação tecnológica como motor do desenvolvimento é um  fato muito positivo para a sociedade e para a economia como um todo.  

E existe estímulo para o empresariado fazer parcerias com universidades e pesquisadores a fim de inovar os processos?

Hoje, pela primeira vez, encontramos um respaldo para que o empresário possa pesquisar. Esse espaço não existia há alguns anos. Não me refiro só as oportunidades mas também as próprias linhas de crédito que existem hoje no âmbito do Ministério da Ciência e Tecnologia, através do Finep e do BNDES. O BNDES, inclusive, tem linhas de financiamento para se pesquisar o que quiser e com dinheiro sobrando, porque não tem demanda. Hoje existe a oportunidade, existe o “dinheiro barato”. Alguns recursos são disponibilizados a fundo perdido, desde que tenha um pesquisador envolvido.   

E o que está faltando?

As pesquisas acadêmicas, desenvolvidas nas universidades do mundo inteiro, na maioria das vezes, podem se transformam em pesquisas aplicadas, mas falta um empurrão de quem tem o tino para fazer isso, que é o empresário. No Nordeste você tem um empresário com coragem de arriscar os recursos disponíveis e altíssima capacidade empreendedora, mas sem o outro lado que é a pesquisa. Aí temos as universidades que são celeiros de cérebros mas que não têm a capacidade empreendedora. É só juntar a fome com a vontade de comer. Eu venho tentando fazer isso há algum tempo, mas é claro que existem as reações. Por incrível que pareça ainda existe aquela parte ideológica, da oferece resistências a essa parceria. De um lado o cientistas que que teme parcerias com o empresariado, de outro o empresário que não quer se envolver com cientistas. Então as partes carregam um estigma que precisa ser ultrapassado. É um processo difícil porque é uma questão cultural.

Nesse contexto também existe a questão financeira? A maioria das empresas do Estado são de pequeno e médio portes, elas têm recursos para investir em pesquisa?

Isso está ultrapassado. Como eu disse, existem linhas de financiamento que oferecem dinheiro barato. O que não se pode é se meter em uma aventura. O Senai é um bom exemplo disso. É preciso ser muito rigoroso na escolha do projeto, da pesquisa que será financiada para evitar que esse recursos seja desviado.  E daí a importância do pesquisador está dentro, para fiscalizar a aplicação dos recursos na pesquisa dele.

Há algum setor com maior necessidade de investimento em inovação?

Não existe setor mais apropriado ou mais ou menos carente para receber inovação tecnológica. Ela é importante para todos os setores. Aqui no Rio Grande do Norte somos carentes de inovação em todos os segmentos da economia. E inovação não é só máquina e equipamento não. Inovação também é ideia. Inovação do produto. Agregar valor e agregar conceito ao produto. Qualquer segmento da indústria nacional tem espaço para se fazer inovação tecnológica – tanto nos produtos quanto nos processos.

Como está a inserção dos pesquisadores nas empresas?     

A maioria dos produtos financiados pelo Ministério da Ciência e Tecnologia exige o pesquisador junto com o empresário, dentro da empresa. Isso foi uma modernização – antigamente exigia a participação da universidade. E era uma burocracia imensa. Isso já é um avanço. O segundo passo é o dinheiro que, antes, ia para a mão do pesquisador, que também não funciona. O modelo ideal é este que está aí que proporciona a parceria entre os entes envolvidos. Apesar disso, a participação dos empresários ainda está baixa. Algumas empresas sequer conhecem pesquisa e não sabem que existem linhas de financiamento específicas. O trabalho da imprensa é fundamental nesse sentido de divulgar. 

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